“Enthrone Darkness Triumphant” é o terceiro full lenght da banda de Black Metal, Dimmu Borgir.
Começo esta resenha com a seguinte pergunta: Quantas vezes você ouviu alguém encher o peito e dizer que “Os anos 90 foram tenebrosos para o Heavy Metal”?. Analisando isso a fundo, podemos dizer que temos “meias verdades”, que parte desse discurso é verdadeiro, porém há exceções que derrubam a narrativa.
É fato que a música muda, novos estilos predominam e com eles aparecem uma leva de fãs que buscam “novos estilos”. Mas, se nos anos 90, o Heavy Metal não continuou na posição onde estava, definitivamente, não devemos culpar as bandas. Ou melhor dizendo, algumas delas!
já que para alguns artistas aceitaram as imposições de suas gravadoras foram aceitas, e levadas à cabo até os dias atuais
Alguém lá fundo gritou Metallica? Falando especificamente de 1997, o ano foi marcado por lançamentos relevantes e outros nem tanto, porém, no geral, encontramos discos que se não agradaram num todo, é certo que uma parte dos fãs se renderam e continuaram acompanhando seus artistas prediletos.
Citando alguns nomes: Judas Priest, Fates Warning, Stratovarius, Iced Earth, Royal Hunt, Rotting Christ, Emperor, Symphony X, Dream Theater, Bruce Dickinson, etc, lançaram seus respectivos novos trabalhos. Alguns desses, trabalhos excelente e importantes para a cena.
Symphonic Black Metal
Pegando o voo desses lançamentos está o Dimmu Borgir, que editou aquele que é considerado por muitos como seu melhor trabalho.
Sim, estou falando do majestoso “Enthrone Darkness Triumphant”, um dos registros geniais e espetaculares do chamado Symphonic Black Metal.
Lançado em 7 de maio (1997), seu terceiro álbum é também o mais bem sucedido, pois a banda estreava na Nuclear Blast, que apostava suas fichas no sucesso comercial. Como resultado, de fato isso aconteceu.
O disco marcou a ascensão do quinteto norueguês, que despontou nas paradas de sucesso de vários países:
- Alemanha (76a posição)
- Finlândia (25a posição)
Portanto, colocando seu nome em evidência, além disso, o Black Metal como estilo que entrava no ringue e se preparava pra briga.
Abordando temas fortes como morte, satanismo, misantropia, ocultismo e o anti-cristianismo, o álbum conseguiu agradar uma gama de fãs, que definitivamente não se familiarizavam muito com o Black Metal. Dessa forma, muitos enxergaram a excelência no do quinteto, passando a enxergá-los com outros olhos. Ou melhor, ouvidos.
Traduzindo: um registro que poderá causar repulsa em alguns desavisados de plantão, e euforia aos apreciadores do lado negro e sombrio da música extrema.
Produção
Gravado no Abyss Studios (Suécia) sob os cuidados de Peter Tägtgren, responsável por ser o engenheiro de som e também cuidar da mixagem. O disco apresenta 10 faixas inéditas divididas em pouco mais de 50 minutos de duração. Além disso, apresenta a banda cantando pela primeira vez no idioma inglês, já que seus trabalhos anteriores foram gravados em norueguês.
Também foi o primeiro registro a trazer o novo e decifrável logotipo, deixando apenas a contracapa com o antigo e indecifrável logo.
Apresentações feitas, é hora de mergulhar de cabeça na sonoridade negra e sombria de “Enthrone Darkness Triumphant”. Antes de mais nada, precisamos saber que não é só mais um disco dos noruegueses, e sim, um de seus melhores trabalhos e da segunda metade da 90’s.
Abertura
O disco abre em alto estilo com a estonteante “Mourning Palace”. Temos aqui, inegavelmente, uma das melhores músicas lançadas pela banda, bem como uma das melhores e impactantes músicas do estilo.
Com seus “5m14s” de duração e mudanças rítmicas que vão do Heavy ao Black, somos envolvidos por belas melodias de teclados. Além disso, ela tem riffs cortantes de guitarras, bateria ultra pesada, vocais poderosos, e harmonias que grudam de imediato na cabeça.
A construção rítmica de “Mourning Palace” é sem sombra de dúvidas um dos grandes pontos na carreira do Dimmu Borgir. A perfeição da referida canção a tornou um clássico obrigatório em suas apresentações.
Ao final, é difícil se desprender de suas melodias, e de seus versos assustadores (ou não):…
“A luz do dia finalmente encontrou seu fim / Como a queda da noite atinge o céu / Bem longe do olhar breve e escuro da luz da Lua/Almas doentes choram de dor…./ Vozes sussurradas, gritos que avisam /E sperando Satã abençoar seus pecados / Anjos com corações negros caem em graça /P ossuído pela procura da escuridão absoluta… Ouça os choros do Palácio da Tristeza / Sinta a obscuridade dos espíritos intranquilos / Ouça os gritos do Palácio da Tristeza / Sinta a destruição do canto assombrador / Eterna é a vida deles na miséria / Eterna é a vida deles na dor….”
Atualmente, ela receberia um videoclipe pomposo, bem produzido e com um enredo cheio de belas imagens. Porém, mesmo de forma simplória, merece atenção especial.
Da obscuridade de “Mourning Palace” para a rápida e agressiva “Spellbound (By The Evil”). Essa faixa também passeia pelo Heavy, embora sua atmosfera densa e agressiva deixe claro tratar-se de Black Metal.
A exemplo da antecessora, temos mais uma canção cheia de variações de andamentos, ora suaves, ora rápidos, até o encontro com os teclados, responsáveis por adicionar uma dose de belas melodias.
Destaques
Destacam-se os backing vocals e coros ao estilo “gregorianos”, que aqui caíram feito luva.
Se a palavra de ordem é “não deixe o ouvinte respirar”, então tal ordem foi cumprida já que “In Death ‘s Embrace” é a grande responsável pelo próximo chute na porta.
Portanto, sem aviso prévio, somos arremessados às melodias rápidas, e riffs pesados de mais uma composição repleta de variações, quebra de ritmos, e harmonias que prendem o ouvinte de imediato, convidando-o a mergulhar na sonoridade branda e belíssima dos teclados, conduzidos com maestria por Stian Aarstad, talvez o melhor tecladista/pianista que já passou pela banda.
Assim que termina a última nota musical, sua letra forte e seus versos perturbadores permanecem grudados no cérebro, destilando trechos como esse:
“…Sem a graça ou o desejo de terminar esta jornada / Nós continuamos viajando em direção a nossa fé / Colhendo espíritos cristãos impotentes / Estuprando a santidade dos santos / O pai celestial está esticando a sua mão / Implorando pateticamente por clemência / Nós cuspimos e mijamos em sua carne sagrada / Como respiramos o ar pecaminosos, ecoam dentro de nossa cabeça…”
Black Metal também é rapidez
Com seu início denso e sombrio, “Relinquishment Of Spirit And Flesh” traz a destruição em forma de música. Rápida, ríspida, agressiva e desprovida de qualquer elemento que possamos chamar de “melodioso”. Adentramos, desse modo, numa composição voltada aos primórdios do estilo, quando as orquestrações e/ou teclados eram algo inimaginável dentro do Black Metal.
Traduzindo: uma canção sem nenhum resquício de melodia, desse modo, indicada aos fãs mais exigentes do estilo, apreciadores do velho Black Metal feito em sua verdadeira essência. Numa lista de prováveis influências, destaco nomes como Hellhammer, Mayhem, Rotting Christ, Borknagar, Satyricon, Emperor, Dissection, Impaled Nazarene, etc. De volta às melodias, porém não se distanciando do “lado negro da força”. É hora de conferir a estupenda “The Night Masquerade”, faixa que conta com os vocais de Bente Engen, assumindo com responsabilidade, entregando perfeição.
Iniciando rápida e veloz, mudando logo em seguida quando as melodias optam por soarem cadenciadas, ao mesmo tempo que a bateria executa blast beats, transformando-a numa das melhores do disco. Além do referido Bente Engen, a faixa conta com os vocais de apoio de Kimberly Goss (Sinergy) em um momento breve, porém interessante.
Vale lembrar que esta foi a única gravada por Bente no disco, e aparentemente de sua carreira já que nenhum projeto envolvendo seu nome fora divulgado. Sob o domínio de vozes de Shagrath, “Tormentor Of Christian Souls” é mais um momento de caos, blasfêmia e perturbação, presente no disco.
Seguindo os mesmos passos sonoros de “Relinquishment Of Spirit And Flesh”, mergulhamos nas harmonias rápidas, agressivas e obscuras de uma canção cuja letra pode causar surpresas até mesmo nos fãs familiarizados com as composições do quinteto.
Trecho:
“…Quando eu vejo sua igreja queimar / E vocês estão chorando, eu rio / Quando eu vejo vocês se entristeceram por seus entes amados / Eu sinto felicidade quando suas almas mortais estão em ruínas… / Eu vou sorrir nas sombras / por aquilo que me dá prazer / Atormentando uma alma cristã…”
*Por conta de sua mensagem demasiadamente “direta”, a Nuclear Blast optou por retirar do encarte sua letra sob a alegação de que a composição apresentava uma certa “agressividade” em seu conteúdo. Mantendo o padrão musical de outrora, “Entrance” é o que poderíamos classificar como o momento “calmo” da banda, e também do disco até o momento.
Apresentando uma cama de vozes repletas de agonia e desespero que, ao mesmo tempo, unem-se às linhas de teclados predominantemente suaves, somos envoltos em uma canção que traça um equilíbrio perfeito entre a suavidade e a brutalidade extrema.
“Master Of Disharmony”
Em dado momento, a nítida sensação de que um porco (animal) está sendo degolado vivo e sem nenhuma piedade por parte de seus executores.
Seguindo a mesma fórmula das duas últimas canções, já que as linhas de teclados e vozes soam perfeitamente idênticas, “Master Of Disharmony” se encarrega de fazer a ponte musical entre “Tormentor Of Christian Souls” e “Entrance”, formando assim uma trilogia repleta de agonia, desespero e aflição, destacando mais uma vez os trabalhos primorosos de Stian (teclados, piano), Tjodalv (bateria), além dos vocais desesperados e perturbadores de Shagrath.
Ou como escreveria o nobre amigo Stephan Giuliano, “Ivete Shagrath”.
Promovendo a destruição
Se a intenção é ser extremo e promover a destruição em forma de música, então é necessário dizer que a missão foi cumprida com êxito, visto que “Prudence Falls” não demonstra nenhuma piedade perante o ouvinte, que tem seus tímpanos rasgados pela pancadaria sonora de suas notas ríspidas.
Em seus quase seis minutos de duração, a música traça um paralelo entre dois mundos, ao mesmo tempo, distintos e extremos. Enquanto Stian Aarstad despeja notas brandas e sutis emanadas através de seus teclados, Shagrath, Silenoz, Nagash e Tjodalv espalham a destruição através de uma atmosfera bruta, agressiva e apocalíptica, extraída dos riffs afiados de guitarras, das bases extremas e pesadas de contra baixo e da bateria veloz e destruidora tal qual uma metralhadora giratória.
Traduzindo: música para dançar coladinho com a patroa, enquanto as crianças participam da festa do pijama com os primos. Não seria nenhum exagero dizer que “Prudence Falls” seria a escolha perfeita para figurar como trilha sonora no dia do apocalipse. Em sua reta final é hora da majestosa “A Succubus in Rapture”, uma das músicas mais lindas do disco, e talvez a canção mais soft da banda.
Enquanto isso, com seus teclados iniciais lembrando Janne Wirman (Children of Bodom), somos conduzidos por uma atmosfera sombria e melancólica, numa canção que traça um equilíbrio perfeito entre a luz e a escuridão. Tal equilíbrio se faz presente principalmente pelos referidos teclados, peça fundamental e grande responsável pelo clima denso e sombrio presente em todo o álbum.
Silenoz
Destaques também para os riffs cortantes das guitarras de Silenoz, responsáveis por destilar um dos solos mais lindos de todo o álbum. Opinião pessoal desse que vos escreve.
Uma das características de “Enthrone Darkness Triumphant” é mostrar que apesar de ser um disco extremo e agressivo (características recorrentes no Black Metal), não há um limite que determine ou coloque isso como uma regra.
Traduzindo: ainda que seja um trabalho totalmente calcado no referido Black Metal, “Enthrone Darkness Triumphant” sabiamente passeia por estilos como Thrash, Melodic Death, Death e Heavy Metal, sem perder sua essência. E o melhor, sem se perder ao longo do caminho.
N do R: particularmente, acredito que o disco abriu as portas para inúmeros grupos praticantes do chamado Symphonic Black Metal. Da mesma forma, fez com que as produções para bandas do estilo supracitado tomassem um outro rumo.
Numa década onde a música sofreu um ataque fulminante, já que estilos duvidosos foram impostos como a “nova onda” do momento, grupos como Dimmu Borgir apareceram como luz (!) no fim do túnel, combatendo o grande pesadelo no qual se encontrava a música pesada, e de quebra, elevando o metal extremo ao topo das paradas de sucesso, surpreendendo até mesmo o fã mais incrédulo.
*Algumas observações acerca do disco:
- .Em sua versão digipack, há ainda uma versão para “Raabjørn speiler draugheimens skodde”, canção gravada originalmente no álbum de estreia “For All Tid”, lançado em 1995, aqui creditada como faixa bônus.
- Em sua nova versão, a música ganhou uma produção mais pomposa e mais cristalina, sem perder a estrutura musical de sua versão original que continua intacta.
- .Em 2005, o disco despontou na 298a posição do “The 500 Greatest Rock & Metal Albums Of All Time” da revista Rock Hard e em 2020, a revista Metal Hammer elegeu o disco como um dos “20 Melhores Álbuns de Heavy Metal lançados em 1997”.
- .Em 2021, a mesma publicação elegeu “Enthrone Darkness Triumphant” como o 7º Melhor Álbum de Metal Sinfônico de todos os tempos.
- Antes de integrar o Dimmu Borgir, o tecladista e pianista Stian Aarstad não havia participado de nenhuma banda voltada ao Metal extremo ou ao Heavy Metal propriamente dito. Sua preferência pessoal, portanto, estava ligada a música clássica.
- Em sua curta passagem pelo Dimmu Borgir, Stian recebeu duras críticas por se apresentar em alguns shows usando chapéu e capa, ou seja, fazendo uma alusão a Jack, o Estripador.
- O músico também não era adepto a maquiagem em excesso, pois preferia usar uma maquiagem simples que o fazia parecer com um cadáver.
Integrantes:
- Shagrath (vocal e guitarra)
- Silenoz (guitarra e vocal)
- Stian Aarstad (teclado, piano, sintetizador)
- Nagash (baixo)
- Tjodalv (bateria)
Faixas:
- 01.Mourning Palace
- 02.Spellbound (By Tthe Devil)
- 03.In Death’s Embrace
- 04.Relinquishment Of Spirit and Flesh
- 05.The Night Masquerade
- 06.Tormentor Of Christian Souls
- 07.Entrance
- 08.Master Of Disharmony
- 09.Prudence’s Fall
- 10.A Succubus In Rapture
- 11.Raabjørn speiler draugheimens skodde