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Resenha: Necrodeath – “Singin’ In The Pain” (2023)

O lançamento de um álbum voltado para o subgênero hídrido mais sólido do Metal é o equivalente ao descolamento de uma placa tectônica, causando o ápice da escala Richter.

É assim que ocorre quando bandas do calibre de Desaster, Deströyer 666, Nocturnal e tantos outros resolvem apresentar novos artefatos forjados no submundo do som podre e grazhny. E eis que no dia 13 de janeiro via Time To Kill Records, a lenda italiana do Black/Thrash Metal resolveu dar as caras novamente. Estamos falando do glorioso Necrodeath!

Voltando um pouco aos tempos áureos…

Enquanto o Thrash Metal vivia os seus primeiros anos de vida, algo surreal e voltado para a podridão, surgia através das tubulações dos esgotos sonoros de várias regiões do mundo. Um desses gratos expoentes é sem sombra de dúvida o Necrodeath. A inspiração ao que Venom, Celtic Frost/Hellhammer trouxeram em matéria de sonoridade suja, densa e ríspida, encontrou os representantes da “velha bota” e isso fez com que mais uma banda nesse formato pudesse surgir dentro dos porões do underground através do seu primeiro e mais famoso álbum, o excelente “Into The Macabre”, de 1987. O Teutonic Thrash experimentou inicialmente bastante dessa combinação, porém desenvolvendo e pavimentando o caminho para o Thrash. Já os italianos optaram por mergulhar em mares mais moribundos e repleto dessa podreira que viria a conquistar muitos adeptos desde então.

Necrodeath/Official Bandcamp

De volta aos tempos atuais…

Após o lançamentos de 12 discos, contando o já citado debut, o Necrodeath retorna com seu mais novo repertório, buscando manter o ótimo nível que construiu ao longo dos anos ou quem sabe até mesmo superar seus trabalhos mais recentes, como é o caso de “Defragments Of Insanity”, de 2019. A data de lançamento do novo álbum faz uma alusão ao fato de “Singin’ In The Pain” ser o décimo terceiro álbum de estúdio dos “blackthrashers”. Além da combinação de números, o registro possui a concepção voltada para o grande clássico de Stanley Kubrick, “A Clockwork Orange” (mais conhecido no Brasil como “Laranja Mecânica”), filme de 1971, que foi baseado na obra original de Anthony Burgess, publicada em 1962.

De acordo com o enunciado feito pela própria banda, é onde a banda nos leva a uma viagem de ida Black/Thrash, representada pela imoralidade e violência, e de volta a uma vã tentativa na redenção e na normalidade. São nove faixas ligadas entre si pelas narrações curtas de Tony Dolan do Venom Inc. e apoiado na final pela presença de Eric Forrest do E-Force (ex-Voivod).

Necrodeath – “Singin’ In The Pain”/Official Bandcamp

E como uma boa shaika com suas tramoias e investidas, nada como iniciar a raskazz com “Gang Fight”, uma das detentoras do autêntico Black/Thrash e que conta a história da gangue do garoto Alex, personagem que liderava um grupo com outros jovens. Ao lado de Tapado, Georgie e Pete praticam roubos, espancamentos e estupros por toda uma Londres arrasada de um futuro indeterminado. A trama entra em cena sob a introdução breve da película, logo inserindo ao seu espancamento sonoro. Pierangelo “Pier” Gonella move sua guitarra para o lado oposto da sonoridade límpida, balançando o tapete empoeirado junto com seus compatriotas para atrair seus fãs para dentro da pista. As variações rítmicas contribuem bastante para o acréscimo de riffs, efeitos e solos. Destaque também para o kit do baterista Marco “Peso” Pesentio. A sequência coloca em primeiro plano “Transformer Treatment”, que além do Black/Thrash convencional, possui partes com boas doses de Thrash. Porém, antes disso temos mais uma inclinação ao filme como forma de introdução, o que mantém o ambiente enquadrado ao lugar específico. O início possui um dedilhado chamativo com as bases ao fundo. Estas provocam rachaduras nas profundezas ao instante que o volume aumenta e as raízes Black Metal ganham espaço no cartaz. Alberto “Flegias” Gaggiotti alterna seus vocais, tornando-os ainda mais célebres e malígnos. As linhas de bateria e os solos enriquecem a estrutura e deixam tudo em ordem quanto à ideia tradicional de se fazer um som ultraviolento de qualidade.

O terceiro hino de tortura atende por The Sweet Up And Down”, dando continuidade à jornada sonora de sua antecessora. A doce subida prenuncia uma queda brusca. Sua sonoridade carregada deixa o ambiente mais nefasto com riffs gordurosos e cortantes. Flegias e Pier se tornam entidades vorazes ao elevarem o patamar e a velocidade da poesia musical. Por conta das variações e paradas entre as modificações do alicerce, pode ser assemelhado ao Torture Squad, sem que entre em uma linha de Death Metal definitiva. O final apresenta vocais completamente distorcidos, enaltecendo os quadros de tortura física e psicológica, que fazem parte do filme, somado ao clima demoníaco que se faz presente. A caminhada pantanosa prossegue aos passos da dualidade entre redenção e perdição com Redemperdition”. Aqui encontramos mais linhas isoladas de Black Metal, somadas ao característico Black/Thrash. Hora de pisar mais fundo no acelerador! Junte Slayer, Razor, Desaster e tempere com Varathron, 1349 e até mesmo o Necrophobic, e você terá praticamente todas as camadas presentes no quarto capítulo do disco.

Necrodeath – “Transformer Treatment”

A deliciosa pancada Thrash acontece através de “Delicious Milk Plus”. Gianluca “GL” Fontana contribui para dar mais peso e estabilidade através de seu contrabaixo pantagruélico. O refrão possui maior diferencial com linhas melódicas distorcidas, o que faz ter a impressão das notas estarem invertidas. E isso funciona muito bem, já que a sequência explode num Rock Veloz desenfreado e cortante como uma britva, até que após os solos surge o momento de molhar a gorlo com uma firegold à sua escolha. Depois de alguns goles temos uma situação bastante caldada em formato de trilha sonora. Não é à toa que os melhores solos de guitarra estão aqui. Antes do fim, voltamos ao refrão “diferentão” bom e funcional. Não confunda com um possível número de telefone de alguma bela e encantadora cheena, pois significa duas coisas, sendo uma o nome da canção. A outra coisa é que “655321” era o número de plenny de Alex, o personagem principal da adaptação cinematográfica. No livro original, de Anthony Burgess, o número do prisioneiro era 6655321. A receita para a condução é novamente a soma de trechos de Black Metal com Black/Thrash. Após a breve intro, temos o início relativo a uma perseguição recheada de solos. A próxima página de acordes e efeitos é variante ao Metal Negro, incluindo os tradicionais tremolos e bateria incessante. O quarteto se destaca por completo, incluindo mais solos, sendo um tanto Rock ‘n’ Roll em questão de estética. A goloss de Flegias passeia firmemente pelos campos sombrios do estilo, enquanto os riffs sujos e cavalares estão diante dos seus ouvidos, na qual você entende bem como funciona tal maquinária skorry e visceral desse eegra repleto de nota dorogoy.

Necrodeath/Divulgação

Voltando ao Black/Thrash com doses de Thrash, temos a violência supersônica de “The (In)sane Ultraviolence”, faixa esta que coloca à tona toda violência provocada por Alex, sendo um ato comum e prazeroso, não apenas para ele e sua gangue como também para a maioria dos jovens de sua idade. O collocol badala junto às tônicas para que o veículo ganhe embalo e dilacere qualquer obstáculo inanimado ou vivo. A canção mostra partes voltadas para o suspense e sem se prender ao velocímetro. O trabalho de percussão é desenvolvido de forma eficaz até que, de repente, chega ao seu fim. A esperteza tirada do dicionário linguístico de Alex, mostra os únicos e espertos em “Oomny-Ones”. Quem surge em primeira mão é simplesmente o baixo de GL. Todo o restante dá as caras em seguida, ditando um ritmo fora do habitual. A cadência toma conta da composição e causa um ar de frescor, mesmo não carregando consigo tanta genialidade.

O livro laranja de violência insana fecha seu último versículo com “Antihero”. Não haveria espaço para algum herói em um tema como esse. Afinal, o herói tem um código de honra para com seus inimigos e o anti-herói não está nem aí. Quanto ao som em si, é daquele jeito que muitos gostam: tenebroso, agressivo, mirabolante, malevolente e impetuoso. Alavanca de guitarra de respeito, caminhonete dando solavancos com tanta velocidade, exceto nas curvas bruscas em ritmo meio que voltado para os sons do oriente médio. As variações contribuem para finalizar o álbum como em um livro de fábulas sobre uma shaika bastante violenta e com seu próprio vocabulário. O zvook é encerrado no formato de rádio em que este vai baixando o volume até sua totalidade. As maiores ressalvas ficam por conta das introduções das músicas, entre as quais não fizeram a devida diferença que se propuseram. A sensação é a de que se as faixas começassem de forma direta, não perderiam o brilho. Mesmo assim, o saldo confeccionado por Dolan e mais ao final na companhia de Forrest, acaba sendo positivo.

A violência pode não ser plena, mas nesse caso enobrece a alma e envenena o seu vizinho ded, fagged e gloopy. No mínimo ele ficará poogly. E sim, estamos falando da violência sonora dos caras do país da bota, que fizeram com que novamente acontecesse o ápice da escala Richter.

Dicionário Nadsat:

Durante o discorrer do texto, pudemos presenciar algumas das palavras criadas pela figura principal da obra, tanto cinematográfica quanto literária, das quais apresentam diversos significados condizentes com cada momento em que aparecem. Essas palavras foram retiradas de uma lista escrita em Nadsat, que é uma linguagem inventada pelo personagem principal, que misturou palavras em inglês, em russo e gírias. Vale ressaltar o álbum conceitual do Sepultura, voltado para esse mesmo filme e intitulado “A-Lex” (2009).

Significado das palavras:

Nota: 8,8

Integrantes:

Faixas:

1. Gang Fight
2. Transformer Treatment
3. The Sweet Up And Down
4. Redemperdition
5. Delicious Milk Plus
6. 655321
7. The (In)sane Ultraviolence
8. Oomny-Ones
9. Antihero

Redigido por Stephan Giuliano

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